sábado, 1 de agosto de 2009

Focaccia: Pra comer hoje!




Panificação sempre me chamou a atenção. Quando eu tinha uns 10 anos, o colégio pediu um livro paradidático chamado "Viagem ao Mundo dos Micróbios", ou algo parecido, pois minha memória não é tão boa assim. Como de costume, quando minha mãe chegava em casa com aquelas 2 ou 3 caixas enooooormes de livros didáticos e paradidáticos, cadernos, blocos de folhas de papel sulfite, almaço, quadriculado, um sem fim de lápis de cor, giz de cera, canetinhas, réguas, esquadros, eu já ia lá fuçar pra ver as leituras que me interessavam, e lia nas férias mesmo, antes das aulas começarem. O sofrível disso, e hoje apenas eu percebo, é que a escola carésima de freiras que eu estudava pedia esse monte de livro paradidático (pelo menos 2 por disciplina, ou seja, pelo menos 10 livrinhos), e na hora de indicar a leitura, discutir os livrinhos, fazer testes, organizar teatrinhos do livro, ou seja, coisas que estimulariam a leitura deles, guess what? Eu terminava o ano com todos os livros lidos por iniciativa minha, porque a escola não se esforçava nem um pouco pra isso. Meus pais eram ocupadíssimos, e acabavam não notando isso (e eu não consigo imaginar porque nunca falei isso pra eles), mas a escola merecia umas boas palmadas!


Meu Deus, essa viagem foi longa! Como eu dizia aí em cima, um dos livros pedidos e nunca usados da escola foi esse dos Micróbios. Foi o primeiro livro daquele ano que eu li, e um dos que eu mais gostei: era sobre uma menina que acordou resfriada, não foi a escola, e quando chegou perto de uma fatia de pão mofada na cozinha, ouviu uma voz misteriosa: era um fungo do pão falando com ela. O fungo ofereceu a ela uma mordida de um cogumelo, ela mordeu e foi diminuindo, diminuindo, diminuindo...até ficar do tamanho do funguinho, e foi conhecer o mundo dos micróbios, desde os microorganismos patogênicos, que causam doenças e são prejudiciais, até aqueles benéficos que formam nossa flora intestinal, fermentam pão, fazem iogurte... Pronto! Dois amores meus juntos: ciências (que vieram a dar cara de Veterinária para mim) e comida! Amei o livro. E comecei a olhar com outros olhos minha mãe fazendo pão, os iogurtes, e até os antibióticos que eu eventualmente tomava para minhas intermináveis crises de sinusite.

Eu demorei para me aventurar na panificação de verdade. Lembro de um episódio com minha grande amiga Maria Tereza, a Placenta. Nós estávamos curtindo a fossa do século das nossas vidas, e ela me convidou pra ir até a casa dela fazer um pão e tomar um café da sua recém comprada cafeteira Bialetti, e lá fui eu. Ela fez o pão, e eu fiquei naquela ajuda de "coloca mais farinha!", "pega a forma pra mim?", essas coisas. Como era o primeiro pão que ela fazia, o nomeamos "Primo", que, imaginávamos, seria o primeiro de muitos pães que faríamos, e assim nunca mais precisaríamos pisar numa padaria. O café da Bialetti (salvo uma exceção, rsrs) ficou ótimo, mas quando tiramos o pão o forno, ai ai ai: ele tinha a casca muuuito grossa, o miolo seco, totalmente sem sal (e sem açúcar, e sem sabor...), uma tristeza! De raiva, comemos o Primo o tanto que aguentamos, e depois fomos fornecendo pequenos pedaços dele para o Lucky, como tira-gosto. Esse episódio aumentou a minha tensão só em pensar em fazer um pão, e quando eu fui fazer o meu primeiro pão solo, peguei a receita infalível da minha mãe. Comprei os ingredientes, amassei, deixei fermentar, tirei o ar, moldei os pães, deixei fermentando de novo, assei e...surpresa!! Meu pão ficara pior que o da minha amiga Placenta! Esse não tinha mesmo condições de ser consumido como pão, e eu acabei fazendo farinha de rosca com ele.


Passou-se o tempo e eu com a pulga atrás da orelha: foi a farinha? foi o forno? foi a fermentação excessiva/insuficiente? foi falta de fermento? Não sei o que foi. Quando fiz meu segundo pão, usei uma farinha melhor, especial para pães, medi os ingredientes direitinho, assei em fogo alto e ele ficou muito bom! Mesmo. Cheiroso, fofinho, casca fina e quebradiça, sem gostinho residual de fermento (que eu odeio)... No mesmo dia, dada as coincidências dessa vida, recebi uma mensagem da minha amiga Placenta, que dizia algo assim: "Amiga, hoje fiz o Secondo, que ficou muito bom, a despeito do Primo!". Sendo ou não coincidência, atingimos as duas juntas o nosso objetivo poético de transformar um cereal em pão, técnica que alimenta o povo da terra há muito tempo. Come-se pão (nas suas mais diversas variações) em todos os cantos do mundo, e eu aqui, na minha cozinha pequena, reproduzo algumas receitas com amor e carinho, para alimentar os que eu amo. Desde o dia do meu primeiro sucesso, vários sucessos já aconteceram aqui, e alguns fracassos, quando tento usar uma técnica que ainda não domino, ou quando não encontro os meus ingredientes preferidos (na minha cidade, nem sempre é fácil). Esse pão é muito simples, sua origem é italiana, e eu o faço sempre que quero comer alguma coisa quentinha, com gostinho de casa, cheirosa, e que me lembre que eu posso partir do ingrediente mais simples para fazer aquilo que vai com certeza agradar a todo mundo. A focaccia de alecrim, que é a mais comum, usa ingredientes que todos temos em casa, como farinha, azeite de oliva, sal grosso, fermento fresco, ou seja, é só levantar do sofá e decidir fazer um pãozinho clássico!


Focaccia é democrática, coloque por cima dela tudo o que você mais gostar. Mas coma no dia: minha focaccia, no dia seguinte, fica borrachuda (e até hoje não encontrei uma receita que não fique).



FOCACCIA DE ALECRIM/TOMATE COM AZEITONAS PRETAS E MOZZARELA DEFUMADA
Adaptada de muitos lugares, é uma mistura de muitas receitas...
Rende 1 focaccia grande, com 2 coberturas



  • 15g de fermento biológico fresco (ativo fresco, 1 tablete)
  • 700g de farinha para pães (pode ser menos, depende da absorção de água da sua farinha)
  • 450mL de água
  • 35mL azeite de oliva extra-virgem
  • Sal (eu gosto de pouquinho sal na massa)

Cobertura de Azeite e Sal (todas as focacce levam):

  • 70mL de azeite de oliva extra-virgem
  • 30mL de água
  • Sal grosso moído (ou flor do sal) à gosto

Cobertura de Alecrim:

  • Ramos de alecrim fresco bem lavado e limpo (somente as folhinhas)

Cobertura de Tomate, Mozarella e Azeitonas Pretas

  • 2 tomates italianos picados em rodelas bem finas, e secos em papel absorvente
  • 20 azeitonas pretas grandes (azapa, califórnia) picadas longitudinalmente
  • 50g de Mozarella defumada ralada na hora (corte grosso do ralador)
  1. Dissolva o fermento na água, acrescente o azeite de oliva e um pouquinho da farinha (mais ou menos 100g) e misture bem. Acrescente o sal, e vá adicionando a farinha e mexendo a massa, até que ela fique muito macia, mas não grudenta e bem homogênia. Pode ser que você não use toda a farinha.

  2. Sove bastante para desenvolver o glúten, e depois deixe-a fermentar numa tigela untada com azeite até dobrar de tamanho (em casa demorou 1h dentro do forno, coberta com filme plástico).

  3. Abra a massa com as mãos, acomodando-a numa forma grande untada com azeite de oliva, até que a massa tenha altura uniforme e fique com, no máximo, 1,5cm. Deixe fermentando por aproximadamente 1h, coberta com filme plástico. Ela vai crescer um pouquinho mais, ficando com cerca de 2-2,5cm.

  4. Pré-aqueça o forno a 250ºC. Faça furos com os dedos sobre a sua focaccia (como na foto). Bata os ingredientes da cobertura básica de azeite (menos o sal grosso) com um garfo ou fouet pequeno, até ter uma emulsão. Espalhe essa emulsão por toda a massa, fazendo com que ela fique empoçada nos furos que você fez com os dedos. Espalhe sal grosso por cima de tudo isso, e leve ao forno por 16-18minutos. Abra o forno, retire a forma de lá, e espalhe: De um lado, as folhinhas de alecrim; de outro, acomode as fatias de tomate, os pedacinhos de azeitona e a mozarella ralada. Volte ao forno por mais 5 minutos. Não deixe sua focaccia dourar: ela é mesmo um pão branquinho.

Um comentário:

  1. hunnnn....estou sentindo o cheirinho daqui......afffff...que agua na boca que me deu...rsrsrs
    olha a coincidencia ai de novo né...postei la no meu bloguinho uma receita de pão e tu vem com essa gostosura aqui e tb contar um episódio super bacana da sua vida.....
    beijão minha linda....e vamos trocar fotinhos dos pães sim ta.....

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